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terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Cegueira para feições


Prosopagnosia em grego: "prosopon" = "cara", "agnosia" = "inabilidade de reconhecer(também conhecida como cegueira para feições) era, até muito recentemente, tratada como uma desordem rara da percepção da face, na qual a habilidade de reconhecer os rostos está danificada, embora a habilidade de reconhecer objetos pudesse estar relativamente intacta. As pesquisas recentes, porém, sugerem que 1 em cada 50 pessoas (2% da população) sofre da desordem em algum grau, e acredita-se que seja hereditária. Até recentemente a desordem estava associada somente a alguma lesão cerebral ou a doenças neurológicasque afetam áreas específicas do cérebro, embora os casos de prosopagnosia congênita ou desenvolvida estejam sendo relatados com freqüência crescente.
Poucas terapias desenvolvidas foram bem sucedidas com pessoas afetadas, embora os indivíduos aprendessem freqüentemente a usar estratégias de reconhecimento como identificar as pessoascaracterística por característica (feature by feature ou piecemeal). Esta estratégia pode envolver indícios secundários tais como a roupa, a cor do cabelo, a forma do corpo, e a voz.
Devido ao fato da face funcionar como uma característica de identificação importante na memória, pode também ser difícil para pessoas nesta circunstância manter-se a par da informação sobre pessoas, e se socializarem normalmente com outras. Segundo pesquisas no campo das Neurociências, a área responsável pelo reconhecimento de faces encontra-se no Lobo Occiptal, em uma região chamada área fusiforme da face. Nota-se que pessoas que possuem comprometimento nesta região, apresentam incapacidade do reconhecimento facial, mesmo quando este é familiar.
Algumas pessoas usam também o termo prosofenosia (prosophenosia), com referência à inabilidade de reconhecer os rostos como conseqüência de danos extensivos dos lóbulos occipital e temporal
O mundo das pessoas sem rosto
Ainda pouco conhecida, a prosopagnosia é uma espécie de “cegueira para feições”; pesquisas mostram que o distúrbio pode ser genético ou causado por lesões neurológicas
por Thomas Grüter
ESPORTISTAS, 1930-1931.ÓLEO S/ TELA DE KAZÍMIR MALIÉVITCH. MUSEU ESTATAL RUSSO, SÃO PETERSBURGO
O que você vê de diferente em mim?”, pergunta Sofia a Juliano, seu irmão mais velho. A garota traz colado no nariz um pedaço de massinha de modelar, como se fosse um nariz de palhaço. Ele tenta adivinhar: “Ah, roupa nova? Está bonita...”. “Não!” “Tênis novos...?” Sofia, já impaciente, afasta a mecha de cabelos que lhe cai sobre a face para facilitar a visão. “No rosto!”, grita. Só então Juliano percebe a massa de forma arredondada.

A inabilidade perceptiva do garoto é denominada prosopagnosia. Trata-se de uma espécie de “cegueira para feições”. Indivíduos afetados pelo distúrbio podem ver o rosto dos outros quase sempre tão bem quanto qualquer pessoa, mas não conseguem retê-los na memória e reconhecê-los. Para eles, essa parte do corpo fica praticamente isenta de peculiaridades: é como se a face equivalesse ao joelho ou à panturrilha. Esse grau de dificuldade é variável e, em muitos casos, as pessoas nem sequer se dão conta de que têm um distúrbio – acreditam que as demais pessoas vêem o mundo exatamente como elas, povoado de faces indistintas.

Na Universidade de Münster, minha mulher, a médica Martina Grüter, e eu temos pesquisado nos últimos anos a variante congênita dessa inabilidade perceptiva e descobrimos que é um problema mais disseminado do que se supõe num primeiro momento, embora os estudos a esse respeito ainda sejam restritos. O conceito de prosopagnosia é uma invenção moderna; a palavra resulta da junção do vocábulo grego prosopon (face) e agnosia (não-reconhecimento). Foi cunhada pelo neurólogo alemão Joachim Bodamer, que iniciou seus estudos sobre o tema durante a Segunda Guerra, quando trabalhou no Sanatório Winnental, um hospital psiquiátrico perto de Stuttgart. Ele observou em dois soldados com lesões graves na cabeça uma acentuada inabilidade de reconhecimento facial. Eles olhavam o rosto dos companheiros, mas não conseguiam coordenar a percepção com a capacidade de reconhecê-los. Ambos compensavam bem a sua obstrução – e um deles não tinha consciência dela.

HABILIDADES DISTINTAS

Um terceiro paciente, com uma lesão por estilhaço de granada na parte posterior da cabeça, padeceu durante uma semana por ver faces grotescamente desfiguradas; ele não conseguia identificar nem mesmo parentes próximos. Bodamer concluiu que ver e reconhecer rostos são atividades distintas para o cérebro e descreveu os casos que acompanhou em um trabalho intitulado Die Prosop-Agnosie, no segundo semestre de 1947.
© TIM HALL/GETTY IMAGES
BRINCADEIRAS E JOGOS desenvolvidos na sala de aula podem ajudar a melhorar a qualidade de vida das crianças afetadas
Nos anos seguintes, vários médicos observaram o mesmo fenômeno em pessoas acidentadas e com outras lesões neurológicas, sobretudo quando o tecido cerebral entre os lóbulos posterior e temporal fora danificado. Uma forma congênita de prosopagnosia era desconhecida até então. Por isso, ela só foi registrada na literatura médica em 1976; nos 25 anos seguintes não mais que uma dezena de casos foram documentados.

Pesquisas e projeções realizadas em nosso grupo de trabalho no Instituto de Genética Humana de Münster, porém, nos levam a crer que cerca de 2% da população é afetada por essa inabilidade em algum grau. Em amostragem recente realizada com 689 estudantes, 17 apresentaram indícios do distúrbio. Em 14 dos indivíduos pesquisados descobrimos sintomas de uma prosopagnosia tanto em parentes próximos quanto nos do círculo familiar ampliado.

Sabemos hoje que se o pai ou a mãe possui essa inabilidade perceptiva, a probabilidade de ela aparecer também nos filhos será de 50%. O sinal característico é, portanto, hereditário dominante. E uma vez que a prosopagnosia afeta igualmente homens e mulheres, evidencia-se que nela não tem participação nenhum cromossomo sexual, mas provavelmente um “autossomo”. Fala-se, por isso, em traço hereditário dominante autossomal .

A inabilidade congênita de reconhecer rostos não necessariamente tem a mesma base neuronal da prosopagnosia adquirida por lesão cerebral. Até o momento só sabemos que ela parece responsável pelo distúrbio hereditário de uma única mutação genética. A exemplo de todos os primatas, nós, seres humanos, temos pouca habilidade olfativa em comparação com outras espécies, o que em geral não nos permite reconhecer nossos semelhantes pelos odores de seu corpo – como fazem, por exemplo, os cães. Em vez disso, temos uma visão altamente aperfeiçoada para identificá-los.
© MJUTABOR/DREAMSTIME
MACACOS RESOS também têm capacidade de reconhecer feições
Mas não somos os únicos. Também os macacos resos possuem habilidade bastante apurada de perceber faces e, para tanto, usam as mesmas regiões cerebrais que nós. Presume-se que há 25 milhões de anos ancestrais dessas duas espécies já tivessem essa capacidade em comum.

Na década de 80, estudiosos da Universidade de Glasgow atestaram o que as mães sabiam desde sempre: lactentes reconhecem o rosto materno e o preferem a outros. Em estudo realizado com 40 bebês de 2 dias, pesquisadores mostravam a eles o rosto da mãe e o de outra mulher: invariavelmente, os recém-nascidos contemplavam a imagem da estranha por menos tempo. Com o uso apenas de fotografias (em vez da presença concreta da mãe) foram excluídas as possibilidades de a criança se orientar pelo olfato e de ter sua atenção desviada por algum gesto ou mímica facial.

ROUPA OU VOZ

O distúrbio herdado que afeta o reconhecimento de rostos pode ser percebido precocemente – e, assim, evitar muito sofrimento emocional. Por isso, entrevistamos mães de filhos com prosopagnosia, questionando-as se elas se recordavam dessa característica em seus bebês. As informações manifestaram uma concordância espantosa: muitas crianças já no primeiro ano de vida demonstraram medo exagerado quando a mãe se afastava. Apesar de certa resistência à proximidade de pessoas estranhas ser considerada normal entre o oitavo e o 12o mês, tanto do ponto de vista psíquico quanto neurológico, uma vez que coincide com uma fase do processo de maturação própria do desenvolvimento infantil, em crianças com prosopagnosia esse estranhamento parece durar mais.

IRRITAÇÃO SÚBITA

Em alguns casos, a mudança de detalhes na aparência das principais pessoas de referência para a criança – como um novo corte de cabelo ou uma toalha de banho enrolada na cabeça após o banho – causa nela uma espécie de desorganização momentânea, fazendo com que reaja com grande irritação.
© ANDRES RODRIGUEZ/123RF
NOS PRIMEIROS ANOS de vida o cérebro se especializa no reconhecimento das faces com que nos defrontamos com mais freqüência
“Os encontros e reuniões na pré-escola eram sempre uma tortura para mim”, comentou uma das mães entrevistadas por nossa equipe: “Todas as outras crianças corriam sorridentes pra lá e pra cá e só minha filha ficava parada em um canto, com medo, sem interagir. Só depois de um tempo entendi que ela tinha receio de não mais me encontrar no meio de outras mães e por isso só brincava se eu fosse a única pessoa adulta na sala”.

No jardim de infância, a garotinha precisou de muito tempo para “se achar” no grupo e se aproximar de seus companheiros. É freqüente, após brincar com alguns colegas por mais de meia hora, que os pequenos com o distúrbio se confundam e já não saibam com quem continuar jogando. Às vezes, não reconhecem a mãe na hora de se despedir ou ao revê-la após uma tarde na escola.

Pesquisas em psicologia com alunos de 4 a 6 anos não costumam revelar nenhuma peculiaridade psíquica. Na verdade, testes de inteligência freqüentemente indicam que essas crianças estão muito mais avançadas em seu desenvolvimento lingüístico do que em habilidades manuais ou de observação visual. Agora, se perguntarem aos meninos e meninas como eles se reconhecem, a resposta é: “Pelo cabelo”, “Pela voz” ou “Pela roupa”.

No ensino fundamental, as dificuldades se repetem: “Alice precisou de meio ano para se sentir à vontade com as outras crianças”, comentou sua mãe. Até a professora ficou preocupada. A garota ficava meio distante durante a aula, olhava tudo em volta – exceto para as pessoas. Mas não apresentava problemas de aprendizagem.
Preocupados, vários pais submeteram os filhos a exames para detecção de autismo, mas não houve confirmação em nenhum dos casos. O diagnóstico de prosopagnosia congênita nunca chegou a ser formulado, pois até há pouco tempo essa inabilidade de observação era completamente desconhecida de psicólogos e pediatras.

Entre os 10 e os 14 anos, aproximadamente, as estranhezas de comportamento diminuem bastante. Torna-se evidente que as crianças desenvolveram estratégias para lidar melhor com sua inabilidade de reconhecer rostos. Em todo o caso, o problema básico persiste e também para os adultos provoca situações penosas. Alguns passam por apuros: “Em uma festa eu tinha engatado uma conversa com uma garota... Saí alguns instantes para pegar uma bebida e quando voltei já tinha esquecido como ela era e não mais a encontrei a noite inteira. Ela deve ter me achado um idiota”, comentou um adolescente com prosopagnosia.

Será possível alguém se livrar de tão desagradável experiência? Por enquanto não temos uma terapia que evite o distúrbio. Mas podemos ensinar as pessoas afetadas a, desde pequenas, reconhecer os sinais externos das outras pessoas com precisão. Além disso, desde os primeiros anos elas devem ser incentivadas a encarar as pessoas com quem estiverem conversando, pois as pesquisas mostram que é a falta de contato visual que mais irrita as pessoas, o que contribui para que sejam isoladas pelo grupo.

Além disso, crianças com prosopagnosia têm condições de obter informações importantes, observando atentamente o que está “na cara”, como idade, estado de saúde, ânimo e humor de seus pares.
OLHOS NOS OLHOS
Algumas ações educativas simples, desenvolvidas na sala de aula, podem ajudar muito a melhorar a qualidade de vida de meninos e meninas com prosopagnosia. É importante, por exemplo, que se acostumem a encarar o interlocutor ao ouvi-lo e ao lhe dirigir a palavra – como a fisionomia não é relevante para elas, é freqüente que esqueçam esse procedimento. Na escola, é possível ensinar crianças com o distúrbio a conhecer melhor os colegas se fotos de todos os alunos, acompanhadas dos respectivos nomes, forem afixadas em painéis ou mesmo na parede.

Jogos e brincadeiras para conhecer os companheiros nas primeiras semanas de cada ano letivo também ajudam na memorização de vozes. Professores podem ajudar alunos com prosopagnosia a associar nomes a sinais externos, dizendo, por exemplo: “Por favor, leve o livro até a Marcela, a de cabelos encaracolados”.

É muito importante que a criança conheça a escola e os futuros professores antes do primeiro dia de aula. Com isso, no início oficial do período, ela pode se concentrar nos colegas. Além disso, nos primeiros dias, os professores devem ter o cuidado de se apresentar com “indícios estáveis”, evitando trocar corte e cor de cabelos e óculos.
ATENÇÃO A OUTROS SINAIS
Uma criança com o distúrbio reconhece as pessoas por sinalizadores como roupas, voz, corte de cabelo e movimentos característicos. Tem dificuldades em reconhecer pessoas na multidão e por isso tem o cuidado de não se soltar da mão do pai ou da mãe. Ao encontrar de forma inesperada uma pessoa com quem tenha familiaridade, freqüentemente não a reconhece. Raramente procura contato visual, o que, em alguns casos, pode levar à suspeita equivocada de autismo.Diferentemente dos autistas, não se aferra a hábitos enraizados e rituais. Tem empatia com os demais, reage de maneira socialmente apropriada a sua faixa etária e tampouco há retardo na aquisição da linguagem.

Quando bem pequena, a criança apresenta muitas reações de estranhamento em relação aos adultos e leva mais tempo que a maioria dos coleguinhas para se integrar aos grupos. No caso da prosopagnosia congênita, na maioria das vezes um dos pais da criança também é acometido pela inabilidade de reconhecer rostos.
APTOS A DISTINGUIR
Quando nasce, a aptidão do bebê para o reconhecimento de fisionomias é ainda difusa; ele adquire a chamada “capacidade de especificação” no decorrer do primeiro ano de vida, e com algumas semanas já percebe quando alguém o olha. Ao longo do desenvolvimento, podemos nos apresentar mais ou menos aptos para determinadas percepções; em relação ao reconhecimento de fisionomias, o cérebro se “especializa” cedo com as que nos defrontamos com maior freqüência.

Em 2005, um grupo de pesquisa-dores da Universidade de Sheffield, coordenado pelo professor Oliver Pascalis, publicou um estudo mostrando que lactentes eram capazes de distinguir até mesmo as fisionomias de macacos – habilidade que acabariam desaprendendo antes de completarem 9 meses. Só aqueles que eram “treinados” com retratos de nossos parentes peludos conseguiam diferenciar os animais mesmo depois dessa idade.
Para conhecer mais
Neural systems for recognition of familiar faces, J. V. Haxby e M. I Gobbini, em Neuropsychologia 45, págs. 32-41, 2007.

First report of prevalence of non-syndronic hereditary prosopagnosia (HPA), I. Kennerknecht et al, em American Journal of Medical Genetics, Part A 140A, págs. 1617-1622, 2006.


Síndrome de Capgras


Também conhecida como Delírio de CapgrasIlusão de Capgras e Paranóia de Capgras, foi descrita pela primeira vez em 1923 no boletim da Sociedade Clínica de Medicina Mental, na França, por Jean Marie Joseph Capgras e Jean Reboul-Lachaux, no artigo entitulado “L`illusion des sosies dans um délire systématisé chronique” (A ilusão dos sósias num delírio sistematizado crônico) e daí em diante a síndrome passou a ser reconhecida com o nome do primeiro autor (Capgras).
Caracteriza-se pelo paciente acreditar que um familiar próximo torna-se um impostor, um duplo, a despeito do reconhecimento de sua familiaridade na aparência e na conduta. Em decorrência da ideação delirante, esse “impostor” ou “duplo” possui um caráter persecutório.
Tais pacientes podem continuar convivendo com o “impostor” ou “duplo”, apesar de “secretamente saberem” que ele, ou ela, não é a pessoa que se diz ser.
Ocorre em ambos o sexos, apesar de inicialmente ter sido descrito apenas em mulheres.
O fenômeno de Capgras acompanha a doença de base do paciente, sendo gealmente de origem funcional e menos frequentemente de cusas orgânicas.
Entre as causas funcionais a mais frequente ainda é a Esquizofrenia, em especial o subtipo paranóide. Mas, os transtonos de humor também ocupam lugar de destaque nas doenças de base para ocorrência da Síndrome de Capgras.
Na verdade o percentual em que o Delírio de Capgras ocorre entre Psicoses orgânicas é maior que entre transtornos de humor. E os quadros orgânicos podem ser bastante variáveis: traumatismo craniano, deficiência de ácido fólico, alcoolismo, malnutrição, etc.. Sem que que haja nenhum marcador bioquímico específico.
Existem ainda muitas explicações psicodinâmicas aplicáveis, dado o fato de que somente ocorre o fenômeno com familiares. Mas, há uma tendências dos artigos mais recentes sobre o tema a tentar encontrar razões biológicas para a ocorrência do fenômeno.
BIBLIOGRAFIA
  1. Síndrome de Capgras: Relato de Caso e Revisão de Literatura
  2. Estudo sobre a estranha Síndrome de Capgras
  3. Lhermitte, Clérambault, Capgras, Frégoli... E Lacan: Ensaio sobre a história da gênese da idéia do Estádio do Espelho
  4. Síndrome de Capgras: Una revisión bibliométrica de la literatura, y análisis de casos clínicos publicados entre 2003-2008

Seu pai entra e você o cumprimenta. De repente, você pára. Esse homem não é seu pai de jeito nenhum. Ele olha como se fosse seu pai, mas você definitivamente acha que não é. Ele foi substituído por um impostor!
foto do filme Invasores de corpos
Foto de Allied Artists/Getty Images
A síndrome de Capgras é rememorativa da trama de "Invasores de corpos", dirigido por Don Siegel, em 1956. O filme conta a história de um médico que retorna a sua pequena cidade para descobrir que alguns de seus vizinhos foram substituídos por pessoas estranhas.
A síndrome de Capgras também é conhecida como erro de identificação ilusória. É o oposto de déjà vu. As pessoas com a síndrome de Capgras acham que seu cônjuge, seus familiares ou até seus animais de estimação foram substituídos por sósias. Imagine como seria constrangedor ter alguém semelhante à pessoa amada a seu lado e que soubesse detalhes íntimos de sua vida, mesmo que você tivesse certeza que esse alguém é um impostor.
A síndrome de Capgras costumava ser considerada bastante rara, mas os profissionais da área médica estão começando a achar que talvez ela não seja tão rara assim. Quanto maior a quantidade de médicos que conhecem a síndrome, maior é a quantidade de pessoas que eles descobrem que a têm. Capgras foi descrita pela primeira vez por dois médicos franceses, Joseph Capgras, de quem a síndrome recebeu o nome, e Jean Reboul-Lachaux. Sua paciente, a Sra. M., está certa de que sua família e seus vizinhos foram substituídos por sósias. Ela disse que tinha tido 80 maridos - um impostor simplesmente ia embora para dar lugar a outro.
A síndrome de Capgras não é a mesma coisa que a cegueira para feições, ou prosopagnosia. As pessoas com prosopagnosia podem ver um rosto pela centésima vez e ainda não saber quem é a pessoa. Você pode passar pelo seu melhor amigo e não reconhecê-lo mesmo que ele o cumprimente (para uma análise mais detalhada sobre cegueira para feições, verifique "A cegueira para feições consegue explicar por que aquela pessoa no trabalho nunca me cumprimenta?" (em inglês). No entanto, as pessoas com prosopagnosia mostram mudanças na condutância da pele quando vêem a foto de uma pessoa conhecida. Parte de seu cérebro reconhece essa pessoa emocionalmente, mesmo que, conscientemente, elas não saibam de quem se trate.
Os portadores da síndrome de Capgras podem distinguir rostos e achá-los familiares, mas eles não associam o rosto à verdadeira sensação de familiaridade. Aquela mulher parece-se com sua esposa, mas você não sente que ela realmente seja sua esposa. Você não tem os sentimentos que deveria ter quando olha a pessoa com o rosto de sua mulher. Sua condutância da pele permanece a mesma, como se estivesse olhando para uma pessoa totalmente estranha. É um problema de desconexão. Então, o que está acontecendo?
Ilusões x alucinações
As ilusões são diferentes das alucinações (em inglês). Uma alucinação é algo que afeta seus sentidos - você vê ou ouve ou sente cheiro de coisas que não são reais. As ilusões estão relacionadas aos pensamentos de uma pessoa - uma pessoa que tem ilusões têm alguns pensamentos e crenças que não são reais.

Causas da síndrome de Capgras

Existem algumas teorias sobre o funcionamento da síndrome de Capgras, umas mais prováveis do que outras. A visão psicoanalítica é que talvez a síndrome seja resultado de um complexo de Édipo ou Electra - desejo sexual por um dos pais e ciúme do outro. As pessoas com a síndrome devem tentar resolver sua culpa em relação a essas circunstâncias identificando seu pai ou sua mãe como um sósia parental. Algumas teorias psicodinâmicas propõem que a síndrome de Capgras tem a ver com os sentimentos reprimidos. Entretanto, a abordagem psicodinâmica era, a maioria das vezes, desacreditada.
Muitos pesquisadores acham que a síndrome de Capgras é realmente o resultado de alguma coisa errada com o cérebro, uma causa orgânica. Eles procuram lesões no cérebro, sinais de atrofia e outras disfunções cerebrais. Embora a síndrome de Capgras geralmente seja vista nas pessoas com transtornos psicóticos, mais de um terço dos pacientes de Capgras apresentam sinais de traumatismo craniano (em inglês) [fonte: Hirstein e Ramachandran (em inglês)]. Muitos portadores da síndrome de Capgras também têm outras doenças orgânicas, como epilepsia (em inglês) oudoença de Alzheimer (em inglês).
Ainda mais médicos e pesquisadores associam a idéia de ser uma causa cognitiva e física. Embora exista alguma coisa errada com o cérebro, como e por que a síndrome de Capgras ocorre em decorrência disso? Talvez a causa orgânica leve a sentimentos de desconexão que, por sua vez, leve à síndrome de Capgras. Talvez seja muito difícil para as pessoas com lesão cerebral atualizarem suas memórias quando vêem uma pessoa e ela lhe parecer um pouco diferente. Seu corpo está tendo uma experiência estranha e seu cérebro luta como uma forma de explicá-la.
Em algum lugar, o cérebro não está se comunicando quando deveria. Essa quebra da comunicação pode estar acontecendo entre a parte do cérebro que processa as informações visuais para as feições e a parte que controla a resposta emocional do sistema límbico.
homem sendo girado em uma gaiola
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Muitas pessoas com a síndrome de Capgras também apresentam transtornos psicóticos. Os médicos costumavam pensar que um paciente normal ficaria tonto se ficasse girando em uma cadeira, enquanto um psicótico, não
O argumento aparentemente recai na possibilidade de a síndrome de Capgras ser um problema de percepção ou de algum outro processo, como a memória. Hirstein e Ramachandran apresentaram a síndrome de Capgras como um problema de "controle da memória". E deram esse exemplo: pense em um computador. Você cria um arquivo e o salva. Quando quer as informações, você abre o arquivo, faz modificações, salva e o fecha novamente. Talvez as pessoas com a síndrome de Capgras fiquem criando arquivos novos em vez de acessar os antigos, de modo que, quando você sai do quarto e entra novamente, você é uma nova pessoa, parecida com a que saiu, mas um pouquinho diferente - talvez suas orelhas sejam maiores, ou seu cabelo, de outra cor. Existe muita coisa que a ciência não sabe a respeito da memória humana.
Alguns estudos também mostraram pessoas cegas com síndrome de Capgras - sua ilusão estende-se à voz da pessoa, pensando que é a voz de um impostor, e não ao rosto; por isso, talvez não seja um problema de processamento facial. Outros estudos mostraram pessoas que estavam certas de que a pessoa para quem estavam olhando era impostora, mas que reconheceram a voz da pessoa ao telefone.
Ataque o invasor

Alguns relatórios afirmam que os portadores da síndrome de Capgras tendem a ser violentos. Houve um caso em que um homem achou que seu pai tinha sido substituído por um robô e o degolou em busca de provas de que ele realmente era um robô.

As pessoas violentas com síndrome de Capgras também são diagnosticadas com distúrbios psicóticos, como esquizofrenia (em inglês) paranóica. As pessoas geralmente têm a idéia de que os esquizofrênicos são violentos e perigosos, mas a incidência de violência em pacientes com esquizofrenia não ultrapassa a da população em geral. Normalmente, são outros fatores que aparentemente predizem a violência - os esquizofrênicos que também são viciados em drogas, por exemplo, têm uma incidência maior de violência [fonte: NIMH (em inglês)].

Transtornos semelhantes à síndrome de Capgras

A síndrome de Capgras é classificada como uma síndrome ilusória de erro de identificação (delusional misidentification syndrome, conhecida como DMS ou DMI). Essas ilusões são monotemáticas, o que significa que se concentram em uma idéia e tornam o mundo um lugar muito estranho para as pessoas que as têm, já que elas vêem as pessoas com máscaras ou talvez nem reconheçam seu próprio corpo.
Síndrome de Fregoli ou ilusão de Fregoli
Em homenagem ao ator Leopoldo Fregoli, que conseguia trocar de roupa com muita rapidez, a síndrome de Fregoli, ou ilusão de Fregoli, leva o doente a acreditar que as pessoas ao seu redor realmente são outras pessoas disfarçadas. Por exemplo, você vê seu médico e acha que ele é sua ex-namorada disfarçada de médico. Uma paciente achou que duas atrizes famosas vestiram a roupa de suas enfermeiras para poderem perturbá-la [fonte: Edelstyn]. Os pacientes com ilusão de Fregoli acham que as pessoas ao seu redor são capazes de mudar a aparência, roupa e sexo em questão de segundos, com apenas vestígios, quase imperceptíveis, de sua identidade real.
homem disfarçado
Ryan McVay/Photodisc/Getty Images. Imagem modificada pelo HowStuffWorks.A ilusão de Fregoli leva o doente a acreditar que as pessoas ao seu redor realmente são outras pessoas disfarçadas
Síndrome de Cotard ou ilusão de Cotard
A síndrome de Cotard ou ilusão de Cotard é a crença de não ter mais os órgãos, partes do corpo ou até de já ter morrido. Algumas pessoas com a síndrome de Cotard acham que não existem mais porque não sentem nada. Essa doença geralmente ocorre junto com a psicose, como a esquizofrenia(em inglês) e o transtorno bipolar (em inglês). As queixas dos pacientes vão de "meu coração não bate" a "não tenho músculos" [fonte: Baeza]. Uma pessoa com a síndrome de Cotard pode pensar que seu cérebro está apodrecendo, que ela não tem alguns órgãos internos ou que simplesmente "derreteu" [fonte: Christensen]. Os doentes acham que são mortos ambulantes.
Intermetamorfose
As pessoas com intermetamorfose acham que seus conhecidos mudaram de identidade, física e psicologicamente. Embora a síndrome de Fregoli envolva apenas uma transformação física, a intermetamorfose inclui a personalidade. Por exemplo, você pode decidir que seu pai é seu irmão, e sempre que você olhar para ele, verá as características físicas e psicológicas de seu irmão.
Déjà vuDéjà vu não é uma síndrome ilusória de erro de identificação, mas é tão constrangedora quanto. O déjà vu acontece com muitos de nós. Você vê alguma coisa e logo tem a impressão de que já viu aquilo antes. Ou alguém diz algo e você tem a sensação de que o que ele falou, o lugar, tudo, já aconteceram. Mas algumas pessoas têm déjà vu crônico. Elas lembram-se de coisas que nunca aconteceram, como já terem assistido ao noticiário, ido ao enterro de um amigo ou encontrado alguém pela primeira vez. Para elas, nada é novo. Um homem disse que não iria ao médico porque já tinha ido antes. Porém, ele não tinha [fonte: Ottawa Citizen]. Para obter informações mais detalhadas sobre o déjà vu, veja o artigo Como funciona o déjà vu.
Bad Moon

Algumas pessoas defendiam a idéia de que a licantropia, ou a crença de que o doente é um lobisomem, podia ser uma forma de erro de identificação ilusória.