A doença de Hirschsprung é uma anomalia congênita que tem como característica intrínseca a ausência dos neurônios intramurais dos plexos nervosos parassimpáticos (Meissner e Auerbach), afetando o intestino grosso, em geral, nos seus segmentos mais distais, como o reto e o cólon sigmóide. Os principais sinais e sintomas da doença são a distensão abdominal que ocorre logo após o nascimento, com presença de vômitos e retardo de mais de 48 horas na passagem do mecônio, sem que haja um fator mecânico obstrutivo reconhecido de imediato. A doença compromete quatro vezes mais os meninos que as meninas e é considerada como devido à falha de migração crânio-caudal da crista neural do vago, tratando-se, pois, de uma neurocristopatia, hoje considerada associada à "deleção" do braço longo do cromossomo 10. Um dos mais intrigantes fatores relativos ao megacólon congênito, além da incidência familiar, é sua alta associação com outras anomalias congênitas que chegam a estar presentes em 28% ou mais, dos casos. Deixada evoluir sem o tratamento precoce, em geral, ela provoca retardo do desenvolvimento que, não raramente, culmina com a morte, quase sempre associada a enterocolites graves. O tratamento é cirúrgico e se resume na retirada do segmento denervado, com reconstrução imediata do trânsito intestinal. O envolvimento do médico geneticista na avaliação desses pacientes é obrigatório já que, com a sua participação, o número total de anomalias adicionais reconhecidas triplica.
Unitermos: megacólon, megacólon congênito, doença de Hirschsprung
O termo megacólon, por consagração, é usado para designar a dilatação e o alongamento do intestino grosso, fundamentalmente devido a alterações da inervação intrínseca dessa víscera, com os conseqüentes distúrbios morfológicos e funcionais. Com essa definição e com o fator etiopatogenético, o megacólon pode ser congênito e adquirido.
MEGACÓLON CONGÊNITO A forma clássica e mais conhecida do megacólon congênito é a decorrente da aganglionose congênita, entidade conhecida desde o século XVI, mas apenas divulgada, como doença estudada, em 1887, por Hirschsprung1. Hirschsprung relacionou os sintomas graves de constipação e o quadro clínico de obstrução, com a hipertrofia e a acentuada dilatação dos cólons, sem que houvesse a possibilidade da demonstração do agente causal. Em 1904, escrevendo sobre a dilatação congênita do cólon, ele relatou sua experiência com os 10 primeiros casos. Tittel2 e Dalla Vale3 descreveram lesões nervosas nos plexos nervosos submucoso e intramural caracterizadas pela ausência de neurônios, que mais tarde foi relacionada ao desenvolvimento do megacólon, proximal ao segmento denervado, e à ausência de neurônios nos plexos nervosos. Trata-se, esse fato, da migração incompleta crânio-caudal da crista neural do vago, fazendo com que o sistema nervoso entérico seja mal-formado, o que, por proposição de Bolande4, constitui-se numa neurocristopatia5. A forma clássica, então conhecida como doença de Hirschsprung (DH), é bem caracterizada pelos sintomas e sinais precoces de obstrução intestinal, na grande maioria das vezes manifestando-se imediatamente após o nascimento. O termo megacólon, para esta situação, foi empregado às custas do aspecto radiológico do intestino grosso, em que o enema opaco é exame que deve ser feito sem preparo. O aspecto de cólon dilatado pode desaparecer com o esvaziamento prévio dos cólons, via anal. Contudo, ao longo dos anos, nas crianças não tratadas e que sobrevivem, o cólon realmente se alonga, dilata e hipertrofia. O desproporcionado crescimento do intestino grosso, principalmente do cólon esquerdo, nessas crianças, confere-lhes notável distensão abdominal, com acentuado alargamento da base do tórax. A constipação crônica e os repetidos episódios de enterocolites contribuem para com o retardo no desenvolvimento do peso e da estatura, o que realça o aspecto da distensão abdominal.
Etiopatogenia O relato de ausência de células nervosas nos plexos ganglionares submucoso e intramural, foi feito, em 1901, por Tittel2, mas a associação de causa e efeito foi somente estabelecida a partir de 1924, quando Dalla Vale3, descrevendo casos de DH, notou sua incidência familiar e observou que o segmento distal não dilatado, não possuía células nervosas ganglionares nos plexos murais. A aganglionose é o fator determinante dos distúrbios observados no megacólon congênito porque estabelece a desarmonia funcional no segmento denervado, de tal ordem que dificulta e mesmo impede o trânsito das fezes. O distúrbio é intrinsecamente funcional, tem caráter genético e o gene de maior relação com a doença está localizado no braço longo do cromossomo 106-9. Além disso, não desprezível, o que se torna em um intrigante aspecto9, é o número de anomalias congênitas que têm sido descritas, associadas à DH, com valores de associações que ascendem ao redor de 28%, distribuídas entre anomalias cardíacas, cerebrais e craniofaciais, além da síndrome de Down9.
Anatomia Patológica A denervação congênita ocorre mais comumente na parte terminal do intestino grosso, envolvendo, em todos os casos, o reto, em extensões variáveis, podendo inclusive envolver o cólon sigmóide, o descendente ou mesmo todo o intestino grosso, o que pode acontecer em 8% dos pacientes com DH10. Todos os casos apresentam-se com a ausência de neurônios nos plexos intramurais e submucoso, no segmento distal não dilatado e nem alongado, mas com o segmento proximal, inervado, alongado, dilatado e hipertrofiado. No local dos gânglios ausentes, observa-se coleção anormal de fibras nervosas espessadas. Na zona aganglionar, os nervos que deveriam terminar nos gânglios espalham-se pelas camadas musculares. Embora todos os casos sejam agangliônicos, a intensidade da inervação intramuscular varia enormemente, de paciente para paciente com a mesma doença. A gravidade clínica é mais consistente com a intensidade de fibras nervosas intramusculares do que com a extensão do segmento aganglionar, o que sugere a atividade desses nervos11. Logo acima do segmento não dilatado, porém denervado, há uma zona afunilada, de comprimento variável, denominada "zona de transição", com características histopatológicas que a tornam diferente do segmento denervado, bem como do segmento proximal dilatado, porém com inervação normal. Essa zona pode ser hipoganglionar ou hiperganglionar. Na grande maioria das vezes, o segmento denervado se limita ao reto e/ou ao sigmóide terminal (90%). Em 7% dos casos o segmento é longo e, em 2%, é total12. Num levantamento feito no Departamento de Cirurgia do Hospital das Clínicas da FMRP-USP, envolvendo 83 pacientes com moléstia de Hirschsprung, o comprometimento do reto até a transição reto-sigmóide foi observado em 80% das vezes, o reto e o sigmóide terminal, em 93,5%; o segmento longo foi visto em 6,5% dos pacientes, não se observando nenhum caso de aganglionose total13. Assim, de acordo com o maior ou menor segmento desprovido da inervação vagal, tendo como limite inferior o esfíncter anal, os pacientes podem ser classificados como possuidores de DH de segmento curto (DHC - 80%) quando o segmento denervado envolve o reto e não ultrapassa o sigmóide e de segmento longo (DHL - 20%), quando o intestino grosso denervado envolve partes proximais ao cólon sigmóide. Dentro dessa classificação, quatro variantes têm sido descritas: 1.Aganglionose total dos cólons (DHTC _ 3 a 8 %)14 2.Aganglionose intestinal total (DHIT)14-17 3.Ausência de gânglios em segmento ultracurto (envolve o reto distal), com definição que se presta à controvérsia18-20 4.Aganglionose segmentar descontinua _ segmento cólico sem gânglio proximal a um segmento normal, mais comum no adulto21.
Fisiopatologia Os gânglios intramurais são os finais comuns, tanto para as fibras nervosas simpáticas como para as parassimpáticas. Na ausência das células ganglionares, a presença de várias fibras colinesterase-positivas adiciona variado grau de incoordenada contração no segmento denervado. Esse fato é, também, influenciado pela inabilidade das fibras catecolamino-positivas em atingir os gânglios e, portanto, exercerem seu papel inibidor22. A fisiopatologia da doença de Hirschsprung é mais bem compreendida quando se entende a integração nervosa do reto e do canal anal. A motricidade do reto e a atividade do canal anal, ou mais propriamente do esfíncter anal interno (EAI), são controlados por estruturas nervosas de características distintas que são o sistema nervoso intrínseco (SNI) e o sistema nervoso extrínseco (SNE). a. SNI (sistema nervoso intrínseco) Como em todo o tudo digestivo, anatomicamente o SNI é constituído por plexos situados na submucosa (plexo de Meissner e de Henle) e na túnica muscular (plexo de Auerbach). Apesar das controvérsias a respeito da inervação do reto e, principalmente, do canal anal, alguns autores23,24 - por causa da diminuição desses plexos no sentido crânio-caudal (reto-anal)24 - reconhecem, ao nível dos plexos mioentéricos do reto, dois tipos de neurônios com relação direta com as células. musculares lisas. Esses neurônios são neurônios excitadores (colinérgicos), inibidores (adrenérgicos) e neurônios excitadores e inibidores não adrenérgicos ou não colinérgicos, denominados de purinérgicos e que têm como mediadores o ATP e o VIP (polipeptídio intestinal vasoativo). Para o EAI os neurônios purinérgicos são inibidores. A atividade tônica persistente do EAI, deve-se, também, a atividade intrínseca (miogênica), além da atividade da inervação extrínseca.
b. SNE (sistema nervoso extrínseco) b1. Simpático Tanto para o reto como para o esfíncter anal interno (EAI) os nervos simpáticos, saindo da medula ao nível de T12 e L2, fazem sinapses nos gânglios mesentérios inferiores com neurônios pós-ganglionares adrenérgicos. Esses ganham a porção proximal do reto por meio dos nervos cólicos lombares e atingem a parte distal do reto e o EAI, pelos nervos hipogástricos. O comando nervoso simpático é inibidor para o reto. A noradrenalina liberada inibe a atividade tônica do reto e promove a excitação do EAI25, por ação direta da noradrenalina nos receptores alfa das fibras musculares lisas do EAI,. b2. Parassimpático O reto e o EAI são inervados por centros parassimpáticos sacrais (S1-S3). No reto, as fibras fazem sinapses com neurônios intramurais colinérgicos excitadores e com neurônios purinérgicos inibidores. A via excitadora, que reforça uma contração sempre presente no reto, tem papel essencial na atividade propulsiva desse segmento do intestino grosso26. No que diz respeito ao EAI, o papel do sistema nervoso parassimpático não está bem definido. Algum efeito inibidor tem sido demonstrado em algumas espécies animais. No homem, quando os nervos pélvicos são estimulados, obtém-se o relaxamento do EAI. Essa inibição parece empregar fibras pré-ganglionares colinérgicas conectadas a neurônios purinérgicos25. Assim, o sistema nervoso parassimpático, essencialmente excitador para o reto, é inibidor para o EAI, porém de forma não relevante. A esses dois tipos de atividade nervosa controlando a função do EAI há a participação intermitente de ondas lentas e ultralentas participando no valor da pressão anal dependente doEAI27-29.
Reflexo Reto-Anal Esse reflexo, também denominado de reflexo inibitório reto-anal, foi primeiramente descrito por Gowers30, em 1877, e estudado, mais recentemente, por Duthie31, fica definido quando a distensão do reto resulta num relaxamento momentâneo do EAI com simultânea contração do EAE. A interpretação desse mecanismo sustenta a idéia de favorecimento para que o conteúdo retal atinja os segmentos mais distais do reto e a transição do reto com o ânus onde receptores sensitivos altamente discriminativos permitem a sensação cognitiva da qualidade física do conteúdo retal e a conveniência ou não de uma ação voluntária que pode ser a de evacuação ou a de contenção, às custas da contração voluntária do EAE. O conjunto _ ampola retal, EAI e EAE _ e os reflexos que interligam essas unidades, numa relação anatômica e temporal, desempenham uma importante função no mecanismo da preservação da continência fecal32,33. A distensão retal que provoca o relaxamento do EAI independe de atividade peristáltica e de centros supra-espinais34, porém exige, para sua performance, a integridade da inervação intrínseca35. Várias outras evidências realçam o papel de um reflexo intramural curto mediando a função ano-retal, assim: · O reflexo pode ser abolido pela secção mais anastomose do reto que fique entre o local da distensão e o canal anal. · É possível obter relaxamento do EAI com distensão do reto, mesmo que o nervo hipogástrico esteja bloqueado ou mesmo quando há lesão nervosa sacral36. Contudo, o papel do componente extrínseco não pode ser totalmente descartado já que a estimulação dos nervos pélvicos provoca inibição do EAI, semelhante à que se obtém com a distensão do reto. · Na moléstia de Hirschsprung, há ausência do sistema nervoso intrínseco e, nessa situação, a distensão do reto não provoca relaxamento do EAI37. A ausência do que classicamente está estabelecido, ou seja, na falta congênita dos neurônios tipo excitador colinérgico (parassimpático) e tipo inibidor adrenérgico (simpático) por si só, não explica todos os fenômenos que caracterizam a doença de Hirschsprung, com o permanente espasmo da zona aganglionar e principalmente pela falta de correlação entre a gravidade dos sintomas e a precocidade de manifestação e extensão do segmento aganglionar. A demonstração de que fibras adrenérgicas normais que se concentram ao redor dos plexos parassimpáticos mantem, também, relação com um 3o. neurônio, pós-ganglionar extrínseco, deixa evidente que as terminações simpáticas exigem a integridade ganglionar mioentérica parassimpática para sua ação inibidora. A atividade adrenérgica inibidora fraca ou quase ausente é superada pelos estímulos colinérgicos excitadores. Esse fato foi demonstrado por reações histoquímicas quando se pôde evidenciar o aumento das atividades colinérgicas nos segmentos aganglionares37. Na ausência dos neurônios efetores e inibidores, a musculatura lisa funciona com estrutura denervada em constante estado de contração sujeito às respostas excitadoras. Além desses aspectos de anomalia nervosa, há o concurso de fibras purinérgicas que são também inibidoras não adrenérgicas e excitadoras não colinérgicas que parecem ser responsáveis pelo relaxamento do peristaltismo e do EAI. Essas fibras purinérgicas inibidoras não adrenérgicas estão ausentes. Por outro lado, a zona de transição, que pode ser área de displasia neuronal38, entre o segmento aganglionar e o segmento normal, contribui para com as alterações registradas na doença de Hirschsprung. Na maioria das vezes, essa zona se caracteriza pela atividade colinérgica diminuída o que implicaria em peristaltismo pouco eficaz, sem a necessária força para vencer o espasmo da região aganglionar. Outro segmento que contribui enormemente para os sinais e sintomas, na doença de Hirschsprung, é o ânus, mais especificamente o EAI, que na perda do reflexo reto-anal exibe comportamento anômalo com contrações espásticas ao invés de relaxamentos, quando o reto é distendido. O funcionamento harmônico do EAI exige integridade da inervação retal intrínseca e presença íntegra das fibras purinérgicas inibidoras. Estudos desenvolvidos "in vitro", usando fragmentos em tira da musculatura lisa do EAI, em ensaios biológicos, têm resultados interessantes não só concernentes à fisiologia do esfíncter como também a respeito da sua farmacologia39,40, com destaque que torna essa musculatura diferenciada e especial quando comparada às camadas musculares longitudinais e circulares do reto e ao músculo longitudinal do ânus, como havia sido destacado anteriormente41. Os estudos farmacológicos envolvendo essas estruturas anais só fizeram por confirmar que o relaxamento esfincteriano é, de fato, mediado por estruturas nervosas não colinérgicas e não adrenérgicas. A procura do tipo específico de neurotrasmissor conduziu a vários resultados possíveis com realce para o ATP (adenosina trifosfato), o VIP (peptídeo intestinal vasoativo) e o CO (monóxido de carbono), como as substâncias clínicas mais próximas a cumprir papel na mediação dos elementos nervosos intrínsecos do segmento anorretal. Contudo, há evidências de que o óxido nítrico, de fato, é o mais importante neurotransmissor não adrenérgico, não colinérgico participando na atividade contrátil da musculatura lisa do esfíncter anal interno, no homem, inclusive fazendo mediação no reflexo reto-anal, e, além do que, tem sob dependência a ação do VIP42-46.
Quadro Clínico O aspecto clínico que mais contribui para o diagnóstico do megacólon congênito reside no fato do sintoma de constipação e/ou obstrução intestinal distal datar dos primeiros dias de vida e, em quase todos os casos, desde o nascimento. Há 3 características salientes que determinam o diagnóstico clínico da doença de Hirschsprung: 1. obstrução neonatal baixa exigindo colostomia para o alívio. 2. recém nascido com quadro clínico de obstrução recorrente, aliviada pelo toque retal ou por clister de salina, mas que acaba impondo o tratamento cirúrgico 3. apresentação dos sintomas efetivos mais tardiamente em pacientes que de inicio apresentavam sintomas leves ou, raramente, ausentes. Do ponto de vista clínico, essa entidade é, basicamente, caracterizada por uma forma de obstrução funcional, tão grave que cerca de 50% das crianças comprometidas e não tratadas, morrem nos primeiros anos de vida e a grande maioria não logra atingir a vida adulta47. Noventa por cento dos recém-nascidos que não eliminam mecônio nas primeiras 24 horas, após o nascimento, certamente têm doença de Hirschsprung. O abdômen distende e sobrevêm vômitos biliosos, mais freqüentes quanto mais se insiste com a alimentação, por via oral.. Eventualmente, percebe-se à inspeção o peristaltismo intestinal e, quando a distensão abdominal se acentua, o quadro clínico de obstrução é acompanhado de desconforto respiratório que pode se expressar por certo grau de cianose. O exame rotineiro deve incluir o toque digital do reto que, em geral, provoca a saída explosiva de conteúdo intestinal com alívio imediato, porém passageiro, da distensão. Quando o toque não libera a rolha de mecônio ou os gases retidos, uma sonda retal e a lavagem por sifonagem dão resultados satisfatórios. Tanto o toque retal como a lavagem por sifonagem, que resultam em alívio da distensão abdominal, tornam-se altamente sugestivos para o diagnóstico de megacólon congênito. Quando o toque retal é efetivo, é de se supor que o segmento denervado seja curto; ao contrário, ele pode ser mais longo. Após essas medidas, a evolução do RN é variável podendo ser relativamente boa, com períodos de constipação e/ou obstrução recorrentes o que, geralmente, provoca o retardo no diagnóstico; ou persistir com quadro grave de obstrução intestinal, determinando intervenção cirúrgica e feitura de colostomia. A demora para com o diagnóstico ocorre mais freqüentemente nos casos em que a sintomatologia só se inicia após os primeiros 2 ou 5 meses de vida. Ao longo da infância, as crises de obstrução vão se tornando menos freqüentes e a constipação mais persistente, com notável prejuízo do desenvolvimento físico da criança.. No lactente e pré-escolar, o aspecto físico é bem característico e chama a atenção o hipodesenvolvimento e o abdômen distendido com a base do tórax alargada. No exame, em geral, o reto está vazio e, nas crianças maiores, quando o segmento aganglionar não é longo, é possível tocar o fecaloma que pressiona a zona de transição. Ao longo da evolução clínica da moléstia de Hirschsprung, a mais temível complicação é a enterocolite, antigamente interpretada e denominada como "diarréia putrefativa", mas que tem como substrato a isquemia do segmento normalmente inervado que pode evoluir com pneumatose intestinal, perfuração, peritonite e morte. Essa complicação fatal é de ocorrência mais comum no período neonatal. Na nossa casuística, a incidência de enterocolite foi de 6%, com 60% de óbitos.
INCIDÊNCIA Estima-se que a moléstia de Hirschsprung ocorra em 1/20.000 a 1/5.000 nascimentos, sendo mais comum nas crianças do sexo masculino do que do sexo feminino, na proporção de 4:1, afetando todas as raças, podendo estar associada com várias outras anomalias congênitas48,49. A incidência racial é significativamente variável e, entre diferentes grupos étnicos, a doença ocorre em 1,5;2,1; e 2,8 por 10.000 nascimentos, entre os Caucasianos, Negros-americanos e Asiáticos, respectivamente50,51. A expressão hereditária da doença é notável em 2,5% dos pacientes com segmento curto e em 12,5% nos pacientes que têm a doença com segmento denervado longo. Ao lado disso está a observação decorrente de estudos epidemiológicos de que o risco de ocorrência de DH em gêmeos foi muito maior que na população geral (4% contra 0,02%)48,50. Favorece, também, o caráter hereditariedade a associação da doença de Hirschsprung com a síndrome de Down (trissomia do cromossomo 21), presente em 2 a 10% dos casos e de anomalias na esfera urogenital, em 3% dos casos48,52,53. Soma-se, ainda, o fato de que é muito mais comum do que poderiam ser explicadas por coincidências, as presenças da estenose hipertrófica do piloro, da má-rotação intestinal, do divertículo de Meckel e das anomalias ano-retais54-56. Isso significa que a DH pode aparecer como traço isolado em 70% dos pacientes, associada à anormalidade cromossômica em 12% e com outras anomalias congênitas em 18% ou mais, dos casos49-51,57-59.
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