As primeiras descrições da DAG relacionaram-se ao surgimento de conjuntivite granulomatosa acompanhada de adenopatia pré-auricular e submaxilar, denominada síndrome oculoglandular de Parinaud.3 Verhoeff 4 acreditava tratar-se de “uma forma de conjuntivite infecciosa com supuração dos gânglios, que parece ser transmitida aos homens pelos animais”. Debré et al.5 observaram o surgimento de linforreticulose cutânea após a arranhadura de gatos. Mollaret et al.6,7 confirmaram a etiologia infecciosa da DAG, reproduzindo as lesões cutâneas em primatas inoculados com pus oriundo de portadores da doença.
A etiologia da DAG é controversa. Diversos microorganismos têm sido implicados, como fungos4, vírus6, clamídias8, micobactérias9,10 e bactérias Gram-positivas.11 Wear et al.12 demonstraram, no entanto, a existência de bacilos Gram-negativos pleomórficos em linfonodos de 39 pacientes com DAG (coloração de Warthin-Starry). English et al.13 obtiveram seu crescimento em meio de cultura BHI (brain-heart infusion) incubados a 32o C.
Tentativas de classificação taxonômicas incluíram o bacilo da arranhadura do gato no gênero Rothia (Rothia dentocariosa),14 Afipia (Afipia felis)15 e, finalmente, Rochalimaea (Rochalimaea henselae), pertencente ao subgrupo a-2 das a-proteobactérias (Tabela 1).16,17 Adal et al.18 acreditam que tanto a Afipia felis quanto a Rochalimaea henselae estão envolvidas na etiologia da DAG. Cerca de 80% dos gatos domésticos de portadores da DAG apresentam anticorpos séricos contra a Rochalimaea henselae.19 Os testes intradérmicos utilizados para o diagnóstico da DAG contêm, principalmente, determinantes antigênicos pertencentes ao gênero Rochalimaea.19,20
O diagnóstico da DAG baseia-se no preenchimento de alguns dos quatro critérios abaixo descritos:2,21,22
1. história de exposição a gatos, com evidência de arranhadura ou mordida;
2. linfadenite regional com exclusão de outras causas de linfadenopatia;
3. teste cutâneo positivo com o antígeno de Hanger-Rose; e
4. análise histopatológica da lesão de inoculação ou do gânglio acometido, revelando estrutura granulomatosa compatível com a DAG e presença de bastonetes pleomórficos demonstrados pela coloração de Warthin-Starry.
1. história de exposição a gatos, com evidência de arranhadura ou mordida;
2. linfadenite regional com exclusão de outras causas de linfadenopatia;
3. teste cutâneo positivo com o antígeno de Hanger-Rose; e
4. análise histopatológica da lesão de inoculação ou do gânglio acometido, revelando estrutura granulomatosa compatível com a DAG e presença de bastonetes pleomórficos demonstrados pela coloração de Warthin-Starry.
A doença da arranhadura do gato é uma doença relativamente comum nos Estados Unidos, representando nesse país a principal causa de linfadenopatia crônica na infância (duração maior ou igual a três semanas)(l). No Brasil existem poucos casos relatados provavelmente não devido à baixa incidência e sim a não inclusão dessa doença no diagnóstico diferencial de várias síndromes clínicas. Torna-se, então, muito importante o conhecimento das várias formas de apresentação clínica para futuramente avaliarmos a sua real incidência na população brasileira.
Há mais de cem anos, Parinaud foi o primeiro a descrever uma inflamação conjuntival com adenopatia pré-auricular seguidas de um contato com animal. Em 1931, Debré observou a ocorrência de uma linfadenopatia regional após arranhadura de gato. Aproximadamente vinte anos após, correlacionou-se a doença com o seu agente causal, a Bortonella hanseleae ou raramente Bortonella quintana (2,3.4,5)
Mais recentemente o gênero Grahamella foi fundido ao gênero Bartonella. No momento, nove espécies cultiváveis pertencem a esse gênero, e quatro dessas espécieis podem causar doenças em seres humanos: B.bacilliforrnes, B. henseleae, B. quintana e B. elizabethae (6).
A doença da arranhadura do gato é uma doença infecciosa, benigna e geralmente se desenvolve após o contato e ou arranhadura de gato em crianças e adultos jovens(7)., estima-se que a incidência seja aproximadamente dez casos para cem mil habitantes por ano nos Estados Unidos, e que representa, nesse país, a causa mais comum de linfadenopatia crônica na infância. Aproximadamente 60-80% dos casos ocorrem em menores de 20 anos e 50% em indivíduos do sexo masculino (2,6).
A doença apresenta pico no outono e início do inverno, provavelmente relacionado com o padrão de reprodução dos gatos e pulgas(8). Postulou-se, durante anos, que as pulgas desempenhavam um papel importante na transmissão da B. henseleae, porém estudos subseqüentes mostraram que elas transmitem a doença preferencialmente de gato para gato, e não para seres humanos (2,5).
A infecção sucede contato direto com gato ou cão. Arnaioria dos animais implicados nos casos de DAG é sadia e tem testes cutâneos para DAG negativos. O gato doméstico pode representar um reservatório importante. Cerca de 76% dos pacientes têm história de uma arranhadura de gato, 2% uma arranhadura ou mordedura de cão e 22% nenhum histórico de arranhadura animal. Raramente pode suceder arranhadura de espinho, lasca de madeira, picadas de inseto ou Varicela. A transmissão interpessoal não foi descrita (2,3,7).
Aparentemente alguns fatores de risco estão associados à doença, como: possuir pelo menos um gato com pulgas e geralmente filhote (12 meses de idade ou mais jovens), história de arranhadura, mordida, lambedura por gato. Gatos do sexo masculino transmitem mais freqüentemente a doença. Não existe relação entre o risco de transmissão e a raça do gato, estado vacinal ou número de visitas ao veterinário durante o primeiro ano de vida do gatinho (2,5,9). Em relação ao quadro clínico pode manifestar-se através das várias formas descritas a seguir (1,2,7,9,10):
- Lesão de inoculação:
Em tomo de 60% a 80% dos pacientes apresentam lesão de inoculação de 3-5mm, que aparece 3-10 dias após a introdução do rnicroorganismo na pele. Geralmente é uma vesícula ou pústula que evolui para pápula. Essas lesões não são pruriginosas e se resolvem sem formação de cicatriz. - Linfadenopatia:
É a manifestação mais comum da doença. Pode ser regional de nodos únicos ou múltiplos. Aparecem aproximadamente duas semanas após a inoculação. Durante os primeiros quinze dias, os ncxlos são dolorosos e pcxle ocorrer eritema da pele, raramente observa-se celulite. O tamanho varia de 1- 5 cm de diâmetro, mas no início o edema e a tumefação podem se estender por 10-12 cm. Cerca de 15% dos nodos supuram. Geralmente regridem ao longo de dois a quatro meses, mas podem persistir por 1-2 anos em 1 % dos pacientes.
A maioria dos pacientes, com linfadenopatia, tem bom estado geral e não apresentam outras manifestações. Cerca de 30% dos pacientes tem febre acima de 38.5°C, mal estar, fadiga, cefaléia e anorexia.
Menos freqüentemente ocorrem esplenomegalia, dor de garganta, conjuntivite, cegueira, exantemas diversos e raramente artralgia e tumefação parotídea. Os adultos apresentam maior tendência a apresentarem sinais e sintomas sistêrnicos do que as crianças.
DAG atípica: Aproximadamente, 15% dos pacientes apresentam manifestações incomuns que caracterizam a forma atípica da doença.
A) Síndrome oculoglandular de Parinaud:
É a mais freqüente das formas atípicas da doença. Caracteriza-se por um granuloma conjuntival no local de inoculação e linfadenopatia pré-auricular. O olho comprometido pcxle exibir linfadenopatia não supurativa.
B) Síndromes neurológicas:
Aparecem em apenas 2% dos pacientes. Costumam suceder em 1-6 semanas o início da linfadenopatia. Ocorre alteração súbita do estado mental, e convulsões; pode ainda ter manifestações de rnielite, radiculite, polineurite, paraplegia, neurorretinite e arterite cerebral. Os sintomas duram 1-2 semanas e a recuperação é completa; raramente os pacientes com alterações focais ao eletroencefalograma pcxlem ter convulsões recorrentes ou déficts neurológicos persistentes, o LCR pode mostrar pleocitose e aumento de proteínas. O tratamento da encefalopatia inclui controle das convulsões e medidas de apoio.
C) DAG sistêmica:
A forma sistêmica da doença está associada com uma duração mais longa, com febre, mialgia, fadiga, exantemas, artralgias e perda ponderal importante. Pode ocorrer pleuris, massas mediastinais, nodos aumentados na cabeça de pâncreas, lesões osteolíticas, pneumonia atípica, tumoração mamária, pápulas angiomatóides, anemia hemolítica, hepato-esplenomegalia, púrpura eosinofílica.
Em relação ao comprometimento hepatoesplênico, o diagnóstico é feito durante a investigação de uma febre de causa desconhecida ou suspeita de malignidade. Na ultra-sonografia aparecem lesões hipoecogênicas e na Tomografia Computadorizada as lesões são hipodensas, ambas localizadas no fígado e/ou baço. Essas lesões parecem abscessos e o exame histopatológico revela um granuloma necrótico.
Esses pacientes geralmente tem febre prolongada, indisposição e perda de peso. A linfadenopatia é reportada em aproximadamente 50% desses pacientes. Adenopatias periportal e periaórtica podem ocorrer. O comprometimento hepatoesplênico não está de claramente relacionado com o aumento do órgão, e os testes de função hepática geralmente são normais. Evidências de granuloma geralmente desaparecem em 1 a 5 meses. Em alguns pacientes as lesões podem evoluir para pequenas calcificações. Recrudescimento de episódios febris podem ocorrer sem re-inoculação.
Em relação ao diagnóstico pode-se afirmar que a presença de 3 dos 4 dos seguintes critérios consolida o diagnóstico
(5,6,7)
(5,6,7)
- Contato com um gato e a presença de arranhadura ou lesão primária na pele, olho e mucosa;
- Teste cutâneo positivo para DAG ou teste sorológico positivo para anticorpos anti-B. henseleae e ou anti- B. quintana;
- Sorologia negativa, incluindo testes cutâneos com derivado protéico purificado (PPD- T, PPD-Battey ) e cultura de aspirado ou e linfonodos realizados à procura de outras causas de linfadenopatia;
- Características hispotatológicas típicas numa amostra de biópsia da pele, linfonodo ou granuloma ocular.
O diagnóstico pode ser confirmado para casos atípicos por uma elevação de quatro vezes o título de anticorpo anti - B. henseleae ou pela demonstração de bacilos pleomorfos pequenos em secções coradas ao Warthin-Starry de linfonodos, pele ou conjuntiva. A biópsia é recomendada somente quando a doença é atípica.
Os achados dependem do tempo da doença; no início apresenta hiperplasia linfóide, proliferação arteriolar e hiperplasia de células reticulares. Subseqüentemente, aparecem os granulomas,geralmente com necrose central e células multinucleares gigantes. Tardiamente aparece infiltrados estrelares: estes não são patognomônicos mas muito específicos (7). Biópsias das lesões hepáticas e esplênicas mostram o mesmo padrão de granulomas e abscessos estrelares, e ocasionalmente tem-se observado os bacilos na coloração de Warthin- Starry (1,6,9).
Em relação à cultura existe a necessidade de condições especiais de cultivo, o que torna esse método diagnóstico pouco utilizado na prática médica (1) . No teste cutâneo, uma reação positiva requer induração maior ou igual à 5mm; infelizmente esse método não está disponível no Brasil (7). Ao que se refere à avaliação sorológica, estudos anteriores mostram que os métodos laboratoroais, incluindo IgM (ELISA) e IFA, tem sensibilidade que variou de 66% a 83%, quando correlacionados à clínica, e de 73% a 93% quando correlacionados ao teste cutâneo, respectivamente. A especificidade variou de 98% para IFA e 95% para IgM(1)
Leucocitose leve a moderada pode ocorrer durante vários dias de doença, relatou-se também eosinofilia. Nas primeiras semanas de adenopatia ocorre um aumento do VHS (7). Em geral, o diagnóstico é firmado com base na história de exposição a um gato, achados clínicos, exclusão das outras causas de linfopatias (9).
Quanto ao tratamento, há um consenso na literatura em restringir a antibioticoterapia ás formas sistêmicas com comprometimento visceral, ósseo, ocular, ou de sistema nervoso central. Testes de sensibilidade in vitro para B.hanseleae tem mostrado boa resposta aos Macrolídeos, Tetraciclinas, Rifampicina, Cefalosporinas de 3°geração, e resposta parcial ao Trimetoprim-Sulfametoxazol e à Aminoglicosídeos . O rnicroorganismo tem se revelado resistente as Cefalosporinas de 1ª geração e às Quinolonas (l,2,6,7,9).
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