Cartografar e combater as desigualdades nas doenças raras Florian sofre de síndrome do X-frágil e há dois anos que espera desesperadamente pela renovação do seu “cartão de invalidez” que o ajuda a superar os desafios quotidianos com um pouco mais de facilidade. «Na administração pública, existe uma completa ausência de sensibilização para as doenças raras. Como desconhecem esta síndrome, para eles é como outra doença qualquer, não fazem ideia das dificuldades que Florian tem passado desde que o cartão expirou. Com 25 anos, vive basicamente em isolamento», explica Michèle Juniere daMosaiques, uma associação da síndrome do X-frágil sedeada nos arredores de Paris. O Dia das Doenças Raras de 2011 pretende realçar este tipo de desigualdades que leva à injustiça e ao isolamento do doente. «Temos bastantes doentes que sofrem desigualdades e que não são reconhecidos pelo sistema. Devemos denunciar estas disfunções na nossa sociedade chamada do bem-estar», conclui Michèle Juniere.
Cada pessoa com uma doença rara tem uma história de injustiça para contar. Para alguns, é sobre obter tratamentos que podem salvar a vida ou serem reembolsados/comparticipados pelos custos do tratamento, ou é sobre obter acesso a serviços especializados ou serem considerados elegíveis para uma compensação por incapacidade. Outros deparam-se com dificuldades para encontrar um emprego, frequentar o ensino, obter um empréstimo ou ter acesso a seguros de saúde.
«Muitas pessoas com doenças raras são tratadas de forma desigual quando procuram cuidados de saúde, serviços sociais, educação, emprego e noutros aspectos da vida quotidiana. Normalmente, isto acontece porque as suas doenças não são devidamente compreendidas pelo seu sistema de saúde», denuncia Anja Helm, responsável da EURORDIS pelas Relações com as Associações de Doentes. «Estas injustiças são mais ou menos graves dependendo da doença e do local onde vive o doente.»
A vida de uma pessoa com epidermólise bulhosa não é igual na Áustria e na vizinha Eslováquia, por exemplo. «Nalguns países, as pessoas com doenças raras têm de suportar a falta de médicos especialistas, enormes dificuldades em obter um diagnóstico e a ausência de tratamento», refere a Dra. Gabriela Pohla-Gubo, co-fundadora da DEBRA Austria e, desde 2006, presidente da Academia EB na EB Haus Austria. A EB Haus Austria, fundada em 2005, é uma unidade clínica interdisciplinar para o diagnóstico, cuidados médicos, assuntos académicos e investigação da epidermólise bulhosa (EB). Para além de tratar doentes da Áustria, já passaram pela EB Haus doentes de 18 outros países. Apesar de o reembolso poder ser um problema, são prestados cuidados de saúde transfronteiriços, que incluem a comunicação com os médicos que encaminharam os doentes (por exemplo, sobre os cuidados pós-tratamento), assim como oportunidades de formação para médicos e técnicos de laboratório estrangeiros para permitir que os doentes possam ser diagnosticados e tratados nos seus países, evitando, assim, longas viagens para os doentes», refere a Dra. Gabriela Pohla-Gubo. Para ela, o tema do Dia das Doenças Raras deste ano é bastante importante porque os «doentes devem ter acesso directo aos cuidados de saúde transfronteiriços e o reembolso deve cobrir os custos com a viagem, a estadia e os tratamentos.»
Existem 40 000 doentes com Fibrose Cística (FC) na Europa; dependendo do local onde vivem, uns morrem antes do seu 10.º aniversário e outros atingem a vida adulta, chegando, em média, aos 30 a 40 anos. Um estudo financiado pela Comissão Europeia, publicado no Lancet em Março de 2010, e que compara a FC em vários países europeus, mostra uma disparidade escandalosa no número de doentes e na idade na altura da morte entre os novos e os antigos Estados-membros, independentemente do tamanho da população e da frequência genética subjacente para a FC. Esta desigualdade pode muito provavelmente ser explicada pelo trágico facto de que, em alguns países da UE, muitas crianças que nascem com FC morrem precocemente durante a infância devido à falta de acesso ao diagnóstico e a cuidados de saúde apropriados.
Um inquérito efectuado pela Sociedade Europeia para a Pediatria Oncológica (SIOPE) revelou as disparidades que existem actualmente na Europa relativamente à acessibilidade e à qualidade dos cuidados para o cancro pediátrico. Das respostas de 21 Estados-membros da UE, apenas 5 deles – Alemanha, Áustria, Bélgica, França e Itália – têm em vigor regulamentação oficialmente reconhecida. «Na Europa, todos os anos aproximadamente 20 000 crianças e adolescentes com idades até aos 19 anos são diagnosticados com cancro. Aproximadamente 80% destes doentes conseguem recuperar se tiverem acesso aos melhores e mais apropriados métodos de tratamento disponíveis. Com os avanços nos conhecimentos sobre o cancro, é possível desenvolver novos métodos de tratamento – menos tóxicos e também mais eficazes. Contudo, é necessário criar a possibilidade de introduzir estes métodos nas normas de diagnóstico e de terapêutica e combater a disparidade no tratamento que existe actualmente na Europa», defende o Professor Jerzy Kowalczyk, Consultor Nacional no campo da Hematologia e da Oncologia Pediátrica na Polónia.
Por vezes, um estudo realça algo diferente daquilo que se esperava. A Sociedade Dinamarquesa de Hemofilia realizou um estudo (2008-2009) sobre os doentes hemofílicos. O objectivo do estudo «Uma vida longa com hemofilia» era cartografar a qualidade de vida, o estado de saúde de acordo com a percepção do próprio doente, o estado da situação laboral e as expectativas para o futuro de doentes com mais de 45 anos com hemofilia moderada ou grave – A, B ou von Willebrand tipo 3. Verificou-se que 68% dos doentes têm emprego, uma percentagem que está em linha com as estatísticas da população em geral; estes doentes fazem apenas uso limitado de recursos como assistentes pessoais e equipamento especializado no local de trabalho; e apesar de muitos se reformarem mais cedo, não têm mais casos de baixas por motivos de saúde do que os seus colegas. Mas esta geração de doentes hemofílicos mais velhos experimenta maiores dificuldades na sua vida quotidiana. «Há 20 anos estavam confiantes no que respeita ao apoio que receberiam e a estabelecerem uma relação com outra pessoa, mas agora exprimem preocupação sobre o futuro e têm problemas em encontrar alguém para um relacionamento. Este estudo mostrou que os doentes com hemofilia estão sozinhos e temem ficar ainda mais sós no futuro», refere Lene Jensen da Sociedade Dinamarquesa de Hemofilia.
«O fosso que existe entre os países e as regiões na Europa ao nível da saúde é ainda mais agravado para as pessoas com doenças raras», afirma Yann Le Cam, Director Executivo da EURORDIS. É nossa responsabilidade promover a igualdade de acesso de todos os doentes aos melhores cuidados disponíveis, independentemente da sua doença e do local onde vivem.»
Caso queira partilhar a sua história para o Dia das Doenças Raras, visite:http://www.rarediseaseday.org/article/rare-disease-inequality-stories-call
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