As porfirias são um grupo de distúrbios provocados por deficiências das enzimas envolvidas na síntese do heme. O heme, um composto químico que transporta o oxigênio e confere a cor vermelha ao sangue, é um componente fundamental das hemoproteínas, um tipo de proteína encontrado em todos os tecidos. A maior quantidade do heme é sintetizada na medula óssea para a produção de hemoglobina. O fígado também produz grandes quantidades de heme e a maioria é utilizada como um componente dos citocromos. Alguns citocromos no fígado oxidam substâncias químicas estranhas, incluindo medicamentos, para que sejam eliminadas mais facilmente do organismo. Oito enzimas diferentes intervêm nas etapas seqüenciais da síntese do heme. Quando existe deficiência de uma das enzimas que participam da produção do heme, os precursores químicos do heme podem acumular-se nos tecidos (especialmente na medula óssea ou no fígado).
Esses precursores, os quais incluem o ácido delta- aminolevulínico, o porfobilinogênio e as porfirinas, aparecem então no sangue e são excretados na urina ou nas fezes. O excesso de porfirinas causa fotossensibilidade, na qual o indivíduo torna-se francamente sensível à luz solar. Isto ocorre porque as porfirinas, quando expostas à luz e ao oxigênio, geram uma forma de oxigênio carregada e instável que pode lesar a pele. Em algumas porfirias, sobretudo quando ocorre um acúmulo de ácido delta-aminolevulínico e de porfobilinogênio, ocorrem lesões nervosas, as quais acarretam dor e mesmo paralisia. As três porfirias mais freqüentes são a porfiria cutânea tardia, a porfiria aguda intermitente e a protoporfiria eritropoética. Esses distúrbios são muito diferentes. Cada tipo de porfiria produz sintomas consideravelmente diferentes, exige exames específicos para o estabelecimento do diagnóstico e o tratamento também difere.
Algumas características são iguais às de outras porfirias menos comuns, as quais incluem a deficiência de ácido delta-aminolevulínico desidratase, a porfiria eritropoética congênita, a porfiria hepatoeritropoética, a coproporfiria hereditária e a porfiria variegada. Excetuando-se a porfiria cutânea tardia, todas as outras porfirias são hereditárias. Todos os indivíduos com uma determinada porfiria hereditária apresentam uma deficiência da mesma enzima. No entanto, a não ser que elas provenham da mesma família, é provável que apresentem mutações diferentes no gene para essa enzima. As porfirias podem ser classificadas de várias maneiras. A classificação segundo a deficiência enzimática específica é a preferida. Outro sistema de classificação diferencia as porfirias agudas, que causam sintomas neurológicos, das porfirias cutâneas, que causam fotossensibilidade cutânea.
Um terceiro sistema de classificação baseia-se na origem dos precursores em excesso: quando elas originam-se principalmente no fígado, a profiria é hepática, e quando elas originam-se principalmente na medula óssea, a porfiria é eritropoética. Um indivíduo que apresenta sintomas de porfiria apresentará resultados de exames laboratoriais acentuadamente alterados. Contudo, os exames devem ser adequadamente selecionados e interpretados para confirmar ou descartar a porfiria. Na maioria dos casos, o médico mensura a concentração de ácido delta-aminolevulínico e de porfobilinogênio na urina na suspeita de porfiria aguda e a concentração de porfirina no plasma sangüíneo na suspeita de porfiria cutânea. Outros exames, incluindo as mensurações da concentrações de enzimas dos eritrócitos, podem ser realizados quando o resultado de um dos exames de investigação for anormal.
Porfiria Cutânea Tardia
A porfiria cutânea tardia, a forma mais comum de porfiria, causa a formação de bolhas na pele exposta à luz solar. A porfiria cutânea tardia ocorre em todo o mundo e é a única porfiria não hereditária. Este distúrbio, uma porfiria hepática, ocorre quando o uroporfirinogênio descarboxilase, uma das enzimas hepáticas necessárias para a síntese do heme, é inativada. Os fatores que contribuem para o seu aparecimento são o ferro, o álcool, os estrógenos e a infecção pelo vírus da hepatite C. Menos comum, a porfiria cutânea tardia ocorre em indivíduos infectados pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV). Embora o distúrbio não seja hereditário, uma deficiência parcial da enzima uroporfirinogênio descarboxilase herdada de um dos pais algumas vezes torna o indivíduo suscetível. Nestes casos, ele é denominado porfiria cutânea tardia familiar.
Sintomas
Ocorre a formação de bolhas nas áreas expostas ao sol (p.ex., dorso das mãos, membros superiores e face). A pele, especialmente a das mãos, também torna-se sensível a pequenos traumatismos. As bolhas são substituídas posteriormente por crostas e cicatrizes e elas levam um longo tempo para sarar. A lesão cutânea ocorre porque as porfirinas produzidas pelo fígado são transportadas pelo plasma sangüíneo até a pele. Pode ocorrer um aumento da pilificação facial. Comumente, o fígado sofre um certo grau de lesão, às vezes decorrente em parte de uma infecção pelo vírus da hepatite C ou pelo consumo abusivo de bebidas alcoólicas. Nos casos muito prolongados, pode ocorrer a cirrose hepática e inclusive o câncer hepático.
Diagnóstico
Para diagnosticar porfiria cutânea tardia, o médico analisa o plasma sangüíneo, a urina e as fezes para detectar as porfirinas. Qualquer forma de porfiria que provoca lesões cutâneas é acompanhada por uma concentração alta de porfirinas no plasma sangüíneo. Na porfiria cutânea tardia, a concentração de porfirinas também encontra-se elevada na urina e nas fezes.
Tratamento
A porfiria cutânea tardia é a porfiria mais fácil de se tratar. O procedimento mais amplamente recomendado é a flebotomia, na qual é realizada a remoção de meio litro de sangue a cada 1 ou 2 semanas. Este procedimento acarreta uma discreta deficiência de ferro no paciente. As concentrações de porfirinas no fígado e no plasma sangüíneo diminuem gradualmente e a pele melhora e, finalmente, recupera-se totalmente. Normalmente, são necessárias apenas cinco a seis flebotomias. Caso elas sejam realizadas excessivamente, o indivíduo pode tornar-se anêmico. Novas flebotomias são necessárias apenas quando há uma recorrência do distúrbio. A administração de doses muito baixas de cloroquina ou de hidroxicloroquina também é eficaz. Esses medicamentos removem o excesso de porfirinas do fígado. Entretanto, as doses muito elevadas (inclusive as comumente utilizadas no tratamento de outras doenças) fazem com que as porfirinas sejam removidas com demasiada rapidez, o que produz um agravamento temporário da porfiria cutânea tardia e lesão hepática. A abstinência alcoólica também é benéfica.
Porfiria Aguda Intermitente
A porfiria intermitente aguda, que causa sintomas neurológicos, é a porfiria aguda mais comum. Porfiria aguda intermitente, uma porfiria hepática, é causada por uma deficiência da enzima porfobilinogênio desaminase, também conhecida como hidroximetilbilano sintetase. A deficiência enzimática é herdada de um dos pais, mas a maioria dos indivíduos que herda a característica jamais apresenta sintomas. A porfiria aguda intermitente ocorre em indivíduos de todas as raças, mas é um pouco mais comum entre os indivíduos oriundos do norte da Europa. Outros fatores (p.ex., medicamentos, hormônios ou dieta) são necessários para ativar o distúrbio e produzir sintomas. Muitos medicamentos (p.ex., barbitúricos, drogas anticonvulsivantes e antibióticos do grupo das sulfonamidas) podem provocar um episódio de porfiria aguda intermitente. Os hormônios (p.ex., progesterona e esteróides correlatos) podem desencadear os sintomas, assim como as dietas hipocalóricas e pobres em carboidratos ou o consumo de grandes quantidades de bebidas alcoólicas. O estresse como resultado de uma infecção, de uma outra doença, de uma cirurgia ou de um distúrbio psicológico também é algumas vezes implicado. Geralmente, trata-se de uma combinação de fatores. Algumas vezes, os fatores que causam um episódio não podem ser identificados.
Sintomas
Os sintomas manifestam-se em episódios que duram vários dias ou mais tempo. Os episódios ocorrem após a puberdade e são mais freqüentes nas mulheres que nos homens. Em algumas mulheres, os episódios ocorrem durante a segunda metade do ciclo menstrual. O sintoma mais comum é a dor abdominal. Ela pode ser tão intensa que o médico pode erroneamente pensar que se trata de um processo que necessita de uma cirurgia abdominal. Os sintomas gastrointestinais incluem a náusea, o vômito, a constipação ou a diarréia e a distensão abdominal.
A bexiga pode ser afetada, o que torna a micção difícil. Durante um episódio, também são freqüentes o aumento da freqüência cardíaca, a hipertensão arterial, a sudorese e a agitação. Todos esses sintomas, incluindo os gastrointestinais, são decorrentes dos efeitos sobre o sistema nervoso. Os nervos que controlam os músculos podem ser lesados, acarretando fraqueza muscular, a qual geralmente inicia nos ombros e nos braços. A fraqueza pode progredir praticamente para todos os músculos, incluindo os envolvidos na respiração. Podem ocorrer tremores e convulsões. A hipertensão arterial pode persistir após o episódio. A recuperação pode produzir-se após alguns dias, ainda que a recuperação completa da fraqueza muscular grave possa exigir vários meses ou anos.
Diagnóstico
Os graves sintomas gastrointestinais e neurológicos são semelhantes aos de muitas outras condições mais comuns. No entanto, a mensuração da concentração dos dois precursores do heme (ácido delta-aminolevulínico e porfobilinogênio) na urina permite ao médico estabelecer o diagnóstico da porfiria aguda intermitente. As concentrações desses precursores encontram-se muito elevadas durante os episódios de porfiria aguda intermitente e assim permanecem naqueles que apresentam episódios repetidos. Os precursores podem formar porfirinas, as quais possuem uma coloração avermelhada, e outras substâncias que possuem uma coloração acastanhada. Por essa razão, a urina pode apresentar uma alteração de cor, especialmente após a permanecer exposta à luz. Essas alterações da cor da urina podem levar o médico a suspeitar de uma porfiria.
Tratamento e Prevenção
Os episódios graves de porfiria aguda intermitente são tratados com o heme, o qual deve ser administrado pela via intravenosa. Nos Estados Unidos, o heme encontra-se disponível sob a forma de hematina. Um outro produto, o arginato de heme, produz menos efeitos colaterais, mas ainda encontra-se em fase de investigação. O heme é captado no fígado, onde ele compensa a síntese reduzida. As concentrações séricas e úrinárias de ácido delta-aminolevulínico e de porfobilinogênio diminuem imediatamente e os sintomas melhoram, normalmente em vários dias. Quando o tratamento é retardado, a recuperação é mais longa e algumas lesões nervosas podem tornar-se permanentes.
A administração intravenosa de glicose ou uma dieta rica em carboidratos também podem ser benéficas, mas são medidas menos eficazes que o heme. A dor pode ser controlada com medicamentos até o indivíduo responder ao heme ou à glicose. O médico suspenderá todo medicamento nocivo e, quando possível, controlará outros fatores que podem ter contribuído para o episódio. Os episódios de porfiria aguda intermitente podem ser evitados através da manutenção de uma boa nutrição e evitando-se medicamentos que podem desencadeá-los. Eles também podem ser desencadeados por dietas radicais para perda rápida de peso. O heme pode ser administrado para prevenir os episódios, mas não existe um esquema terapêutico padrão estabelecido. Os episódios pré-menstruais podem ser prevenidos com a administração de um dos análogos do hormônio liberador de gonadotropina utilizados no tratamento da endometriose. Entretanto, este tratamento ainda se encontra em fase de investigação.
Protoporfiria Eritropoiética
A protoporfiria eritropoiética, na qual ocorre um acúmulo de protoporfirina na medula óssea, nos eritrócitos e no plasma sangüíneo, produz fotossensibilidade cutânea. Nesta porfiria hereditária, existe uma deficiência da enzima ferroquelatase. A deficiência enzimática, a qual é herdada de um dos pais, provoca um acúmulo de protoporfirina na medula óssea e no sangue. O excesso de protoporfirina passa, através do fígado, para a bile e é excretada nas fezes.
Sintomas e Diagnóstico
Geralmente, os sintomas iniciam na infância. A dor e o edema iniciam logo após a pele ser exposta à luz solar. Como a formação de bolhas e de cicatrizes é incomum, os médicos nem sempre reconhecem a doença. O diagnóstico também é difícil porque a protoporfirina é muito insolúvel e não é excretada na urina. Por essa razão, o diagnóstico é estabelecido quando são detectadas concentrações altas de protoporfirina no plasma e nos eritrócitos. Por razões desconhecidas, a gravidade da protoporfiria eritropoética varia consideravelmente de um indivíduo a outro, mesmo dentro de uma mesma família. Um indivíduo pode ser afetado de modo significativo pela doença, enquanto um parente próximo com a mesma mutação genética pode apresentar pouco ou nenhum aumento de protoporfirinas e pode ser assintomático.
Tratamento
A luz solar deve ser evitada. O beta-caroteno, quando utilizado em quantidades suficientes para causar uma coloração amarelada da pele, é particularmente eficaz, uma vez que ele torna os indivíduos mais tolerantes aos raios solares. Os indivíduos com protoporfiria eritropoética podem produzir cálculos biliares que contêm protoporfirina. Pode ser necessária a remoção cirúrgica dos cálculos biliares. Uma complicação mais grave é a lesão hepática, a qual, algumas vezes, exige a realização de um transplante de fígado.
Essa doença eu não conhecia. Ela tem cura?
ResponderExcluirOlá, eu apresento alguns sintomas citados na sua pesquisa. Embora, nunca tenha apresentado essas feridas. Quando me exponho ao sol, apenas nas áreas que estão descobertas, e após uns 5 minutos de exposição, começam a surgir alguns focos de vermelhidão, aumentam gradativamente, incham e formam um placa esbranquiçada que provoca um grande ardor e coceira intensa. Se eu não me importar com a coceira e nada fizer, as manchas desaparecem ao sair do sol, com mais ou menos meia hora... Caso contrário, se coçar ou massagear as áreas afetadas, a vermelhidão se espalha por todo o corpo e o inchaço das partes aumentam consideravelmente, tornando-se insuportavel. Como medicamneto, faço uso de qualquer anti-histaminico ( como o polaramine) Após a administração do medicamento, as manchas, o inchaço e avermilhidão somem em um prazo de meia hora a uma hora completa. Já fiz vários exames para investigar as causas ou até a doença em si que possuo. Nos exames realizados, um unico fator se mostrou anormal, uma alta taxa do IGe. Existe alguma doença associada a esse sintoma? Será que tenho a Porfiria Eritropoética? Mesmo sem apresentar feridas?
ResponderExcluirExiste alguma ligação com o Lupus? Ou entao com alguma doença reumática? Li em outra materia que essa doença também está relacionada com o desequilibrio hormonal. Atualmente faço tratamento para o controle hormonal.
Esse já é um passo consideravel para a investigacao pelos meus médicos. Agradeço quaisquer consideraçoes!